O dia que esqueci quem era

15:12

Eu acordei como sempre, com o despertador tocando. Ele tá marcado pra tocar as seis e cinquenta há pelo menos cinco meses, e há mais de cinco meses que eu não tenho necessidade de acordar esse horário.  Levantei, me olhei no espelho e me vi estranha, com cabelo desgrenhado, a tinta que deveria ser azul estava verde, meu rosto tinha sumido mais da metade das manchinhas do melasmo, o rosto estava magro, quando terminei o banho que me sequei assustei ao ver os ossos do quadril, eu não via tinha muito tempo.
Foi então que notei que o ácido do rosto está fazendo efeito, notei que a tinta do cabelo desbotou, notei que perdi mais de quatro quilos e que nenhuma roupa mais servia direito. Notei que não me cuidava há dias, só estava no automático, e isso me assustou.
Desde o natal que eu não me arrumava, que eu não tinha mais vontade de nada. E cá pra nós, não era isso e nem é, o que eu quero. Estou tentando me achar, tentando saber se ainda sou quem eu sempre achei que era, mas bola pra frente e ver onde a vida vai me levar.

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Perda Gestacional - É real, é sentida.

01:02

Quem acompanha o blog há um tempo lembra que uma vez perdida eu fazia uma postagem intitulada de 'ForaDoComum' e nela eu falava coisas que aconteciam fora do meus textos e dos livros. Já falei do meu casamento, do aniversário do meu melhor amigo, da minha visita ao ICIA... enfim, já falei de algumas coisas bem bacana. Mas o que eu trago hoje é um fora do comum bem incomum. Em vários posts do blog eu escrevo para o meus filhos, um em especial. Mas eu nunca contei o que realmente aconteceu em nenhuma das gestações, e muitas pessoas só souberam da minha gravidez através do blog, inclusive pessoas próximas. Vou tentar resumir pois se começar escrever eu surto e desisto. Minha primeira gestação foi em agosto de 2015 e durou até outubro. Eu estava tratando um derrame que tive por causa do lúpus, o qual sou portadora há 12 anos, e com o excesso de remédios o feto não resistiu e acabei perdendo meu primeiro anjinho dia 15 de outubro de 2015. Minha segunda gestação foi interrompida no dia que eu descobri, em março de 2016. Estava suspeitando, os sintomas e os etc eram todos iguais a primeira. Descobri pela manhã mas perante tudo que tinha passado sabia que ela não ia pra frente, e na noite daquele dia aconteceu. Como desde que descobri o lúpus sabia que seria difícil uma gestação, achava que seria forte caso um dia acontecesse algo grave, mas não, nunca estive.

Mas como a segunda não teve um peso tão gritante por eu já está ciente do que ocorreria, eu não surto tanto como surto quando lembro da primeira, e é justamente dela que eu quero falar. Bom, quando perdi meu filho eu fui vítima das piores palavras, conselhos e insensibilidade que uma mãe pode ser. Ouvi pessoas falarem coisas do tipo 'ele não tinha que ser seu' 'Seja forte, logo logo terá outro' 'Foi melhor agora do que mais pra frente' - como coisa que tem hora pra se perder um filho. 'Não deu nem pra se apegar' 'Ah, mas nem o amava' 'Isso já tá virando frescura, logo engravidará de novo'
Meu filho já era amado mesmo antes de eu e meu marido pensarmos em engravidar. E acredito que seja assim com  milhares de outras mulheres que passam pela dor da perda gestacional ou neonatal. E engana-se quem pensa que a dor pior é a dor da mãe que perdeu um RN pois não é, filho é filho e o luto é real e sentido. Não subestime nenhuma mãe no seu período de luto, de dor. Se realmente quer ajudar, consolar, evite falar coisas como as que eu falei entre aspas ali em cima. Isso machuca muito, isso dói bastante.

Nesses meus momentos, um grupo chamado 'DO LUTO A LUTA' me ajudou de uma forma que eu nem sei falar, e sei que ajuda muitas outras mães. Apoio, carinho, conversa, é uma forma de mostrar que se importa e que quer ver bem aquela mãe que está de braços e ventre vazio.
Eu sempre procuro, hoje, mandar uma mensagem positiva, oferecer uma conversa, fazer qualquer coisa para uma mulher que esteja passando pelo que eu passei, pois na minha época eu não tive NINGUÉM, isso mesmo, ninguém meeeeeeeeeeeeesmo que se importasse tanto com aquele momento, não teve uma pessoinha se quer que se ofereceu pra ir ao médico comigo, que perguntou se eu tava bem, se eu queria falar sobre meu filho, e isso é uma magoazinha que me corrói até hoje, mas não devemos guardar esse sentimento, não é mesmo?


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Vou deixar uma listinha de coisas que mais me doeram ouvir. E se você é uma mãe que passou por isso, sinta-se abraçada, sinta-se confortada e saiba que lá do céu nossos anjinhos estão olhando por nós, e um dia iremos nos encontrar. Seja forte, voce é guerreira, é linda, é especial, foi escolhida pra ser mãe de um anjo. Suas lágrimas um dia vão diminuir, talvez acabar, a lembrança vai continuar e seu amor, ah eu amor, esse nunca vai morrer. 

- Ele não era pra ser seu
- Você é jovem, logo vai ter outro
- E ai, já começou a praticar outro?
- Nem deu tempo você amar
- VOCÊ TÁ SOFRENDO POR UMA COISA QUE MAL EXISTIU (esse foi o que mal doeu principalmente pela pessoa que falou)









Uma carta na madrugada

02:59

E hoje me bateu uma saudade de escrever pra você, afinal, existem meses que não paro pra pensar em você. Chega a ser bem engraçado, mas antes era tão frequente e doloroso. Hoje não falo de você com a frequência que falava, não consigo nem falar direito, acho que sua lembrança caiu no esquecimento diário mas vive nas lembranças do coração.
Esses dias lembrei que em 2012 você falou sobre fazer cinco anos de nossa 'amizade' e então lembrei que esse ano faria dez anos.
E o que rolou nesses dez anos, não é mesmo? Não, eu ainda não parei de comer carne, ainda não me formei na faculdade, ainda não tenho filho, ainda não mudei pra Gramado, ainda não publiquei um livro, ainda não visitei o museu, ainda não fiz tantas coisas que eu sonhava.
Mas eu andei de avião, eu casei, eu bebi pitu, eu me arrisquei num relacionamento sem futuro, eu aprendi uma nova paixão que é criar coisas e desenhos, eu adotei vários gatos, eu me tornei professora de crianças, eu não reclamo mais de ter que ir ao médico.
Mas eu ainda não conclui o tratamento da depressão, também não me arrisquei em pensar em uma outra faculdade sem ser jornalismo.
Essa madrugada lembrei de quando você conseguia código dá Tim pra mandar SMS sem gastar os poucos créditos que tínhamos na época de adolescente, só pra saber se às 3h eu já estava dormindo ou ainda estava mexendo no meu casaco azul e chorando sem saber o que seria de mim.
Olha, eu ainda mexo no casaco e ainda choro, mas não tem mais nenhum SMS, ou como é comum hoje, uma msg via whatsapp (que você nem chegou a conhecer) pra saber se dormi, se tô com medo, se preciso falar de bolsas ou de personagens fictícios.
Quem me ver falando assim nem imagina o quanto eu odiava suas falhas, suas manias absurdas e sua constante mudança, mas nós sabíamos como minha depressão e sua bipolaridade nos afetava e nos protegia.
Um dia, meu bem, quando eu tiver uns filhinhos bochechudos, eu vou falar pra eles de você, de quanto você era insuportável e mesmo assim amável. Nunca vou te esquecer completamente e esteja você, hoje, num bom lugar e que, se possível, olhe por mim aqui em baixo.

Eu te dedico, seu intruso!



Um remédio leve

10:03

Esquecer do sol que combina com o céu azul é impossível, pois nesses dias a alegria se faz presente em cada centímetro.
Não existe formula secreta que faça as coisas certas se tornarem obrigatórias em nosso mundo, mas existe a forma certa de nos obrigar a olhar no mundo o verdadeiro sentido de viver. Existem milhares de pessoas responsáveis por sorrisos, bem mais na soma total que as pessoas que provocam as lágrimas.

Perder o folego de tanto rir, esquecer que os ponteiros do relógio nos movem, riscar da agenda o nome daquela amiga que só te coloca pra baixo, desligar a tv enquanto passa um programa lixo, desligar o telefone quando estiver do lado de pessoas importantes... coisas pequenas que movem o mundo, que nos tornam melhores e mais fortes. Isso não é formula pra felicidade, mas sim um meio de tornarmos nosso coração e nossa mente mais sadios. E quanto mais seguirmos os passos para uma áurea limpa, mais leve ficamos.



Seus passos

10:30

Todos os dias é sempre a mesmas palavras quando nos despedimos logo cedo, e sei que vem do fundo dos nossos corações.
Nós podemos brigar, gritar e querer atear fogo um no outro, mas um riso de canto de boca quebra o outro.
Todos os dias eu te amo um pouquinho mais, e se as vezes te jogo na cara o que você fez é pra tentar te magoar, embora saiba que é errado. Mas te forçar a sentir minha dor é um jeito de querer dividir com você não só as alegrias.
Eu amo tanto você que dói no meu peito e quando eu não mais estiver aqui quero que sorria lembrando dos meus olhos quando como cachorro quente, que lembre de como só minha unha te arranha e como eu seguro nossos gatos chamando de bebê.
Eu amo você e quero ver todos os seus passos, e mesmo que a presença física não seja mais o que você tenha de mim, saiba que você foi meu grande amor.


Nunca fui boa

22:53

Nunca fui boa em esconder meus sentimentos, fosse ele de amor até a raiva. Nunca consegui disfarçar minha cara de tédio perante tantas situações e tantos assuntos.
Não consigo me calar mesmo diante das mais assustadoras situações da vida. Eu reaprendi a superar meus medo através das minhas verdades e isso sempre me gerou mal estar entre eu e qualquer pessoa que tivesse que ouvir minhas verdades. Mas afinal de contas, será que eu tinha mesmo o direito de falar o que eu achava diante de uma sociedade tomada por falsos olhares e falsas verdades?
Não sei se um dia conseguirei 'segurar a língua' mas a cara, essa não conseguirei disfarçar nunca.
E assim sigo minha rota, com algumas pausas e alguns gritos. Mas essa sou eu, a pessoa que nunca foi boa em esconder o que sente.